segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Lúcifer

A noite estava bonita e estrelada, e o céu coalhado de nuvens que recortavam sobre o azul as formas caprichosas. Lúcia tinha a alma poética; falava da natureza com o entusiasmo ingênuo que dá a vida contemplativa àqueles que não conhecem os segredos da ciência; muitas vezes fazia-me perguntas que me embaraçavam; outras cortava a frase colorida com um riso em que vertia a sua fina ironia.
— Ali está a minha estrela! Olhe, sou eu! disse mostrando-me Lúcifer, que se elevava no oriente, límpida e fulgurante.
Não pude deixar de sorrir-me.
— És muito linda no céu, sobretudo hoje que vestes um manto de tão puro azul; mas eu te prefiro aqui junto de mim, Lúcia.
— Também eu; antes queria viver sempre neste cantinho da tem como agora, respondeu-me tomando as mãos e olhando-me, do que no céu como ela brilhando para o mundo inteiro.
Calou-se um instante.
— Se eu ainda lá estivesse, desceria agora para vir sentar-me aqui. Mas Lúcifer deixou no céu a luz que perdeu para sempre.
Trecho do livro Lucíola, de José de Alencar.

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