terça-feira, 29 de junho de 2010

Uns versos

Sou sua noite, sou seu quarto
Se você quiser dormir
Eu me despeço
Eu em pedaços
Como um silêncio ao contrário
Enquanto espero
Escrevo uns versos
Depois rasgo

Sou seu fado, sou seu bardo
Se você quiser ouvir
O seu eunuco, o seu soprano
Um seu arauto
Eu sou o sol da sua noite em claro,
Um rádio
Eu sou pelo avesso sua pele
O seu casaco

Se você vai sair
O seu asfalto
Se você vai sair
Eu chovo
Sobre o seu cabelo pelo seu itinerário
Sou eu o seu paradeiro
Em uns versos que eu escrevo
Depois rasgo
Musica: Uns Versos
Intérprete: Adriana Calcanhotto

domingo, 27 de junho de 2010

Passado

Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado.
Karl Marx.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Eternamente


 O que a memória ama fica eterno.
Te amo com a memória, imperecível.
Adélia Prado.

O amor

E respirei da tua alma o hálito inebriante,
- Misterioso perfume à sombra derramado;
Visto que te escutei tanto segredo, tanto!
Que vem do coração, dos íntimos refolhos,
E tive o teu sorriso e enxuguei o teu pranto,
- A boca em minha boca e os olhos nos meus olhos.
Victor Hugo.

Teu riso

Nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.
Pablo Neruda.

Rios invisíveis

As lágrimas que não se choram
esperam em pequenos lagos?
Ou serão rios invisíveis
que escorrem até a tristeza?
Pablo Neruda.

Tá tudo bem

O que quero dizer é justamente o que estou dizendo. Não estou com pena de mim. Tá tudo bem. Tenho tomado banho, cortado as unhas, escovado os dentes, bebido leite. Meu coração continua batendo - taquicárdico, como sempre. Dá licença, Bob Dylan: it’s all right man, I’m just bleeding. Tá limpo. Sem ironias. Sem engano. Amanhã, depois, acontece de novo, não fecho nada, não fechamos nada, continuamos vivos e atrás da felicidade, a próxima vez vai ser ainda quem sabe mais celestial que desta, mais infernal também, pode ser, deixa pintar.
Caio Fernando Abreu.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

66 anos de Chico



"Olhos nos olhos, quero ver o que você diz..."
Música: Olhos Nos Olhos | Composição: Chico Buarque



Francisco Buarque de Hollanda (Rio de Janeiro, 19 de junho de 1944), mais conhecido como Chico Buarque ou ainda Chico Buarque de Hollanda, é um músico, dramaturgo e escritor brasileiro.

domingo, 20 de junho de 2010

Não há falta na ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
Carlos Drummond de Andrade.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Feito de suspiros


Provavelmente está feito de suspiros o silêncio que precede o silêncio do mundo.
José Saramago.

Catorze de Junho

Cerremos esta porta. Devagar, devagar, as roupas caiam
Como de si mesmos se despiam deuses,
E nós o somos, por tão humanos sermos.
É quanto nos foi dado: nada.
Não digamos palavras, suspiremos apenas
Porque o tempo nos olha.
Alguém terá criado antes de ti o sol,
E a lua, e o cometa, o negro espaço,
As estrelas infinitas.
Se juntos, que faremos? O mundo seja,
Como um barco no mar, ou pão na mesa,
Ou rumoroso leito.
Não se afastou o tempo. Assiste e quer.
É já pergunta o seu olhar agudo
À primeira palavra que dizemos:
Tudo.
"Catorze de Junho". Poesia extraída do livro Poesía completa, de José Saramago.

José

Começar a ler foi para mim como entrar num bosque pela primeira vez e encontrar-me, de repente, com todas as árvores, todas as flores, todos os pássaros. Quando fazes isso, o que te deslumbra é o conjunto. Não dizes: gosto desta árvore mais que das outras. Não, cada livro em que entrava, tomava-o como algo único.
José Saramago.
José de Sousa Saramago (Azinhaga, Golegã, 16 de Novembro de 1922 — Lanzarote, 18 de Junho de 2010) foi um escritor, argumentista, jornalista, dramaturgo, contista, romancista e poeta português. Foi galardoado com o Nobel de Literatura de 1998. Também ganhou o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário da língua portuguesa. Saramago foi considerado o responsável pelo efetivo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Ah! O amor...



A vida é muito bonita,
basta um beijo
e a delicada engrenagem movimenta-se,
uma necessidade cósmica nos protege.
Adélia Prado.

Confissão

Esvaíra-se-lhe o sorriso, e o olhar tornara a ser opaco. Estácio teve medo daquela atonia e concentração; travou-lhe do braço; a moça estremeceu toda e olhou para ele.
A princípio foi esse olhar um simples encontro; mas, dentro de alguns instantes, era alguma coisa mais. Era a primeira revelação, tácita mas consciente, do sentimento que os ligava. Nenhum deles procurara esse contato de suas almas, mas nenhum fugiu. O que eles disseram um ao outro, com os simples olhos, não se escreve no papel, não se pode repetir ao ouvido; confissão misteriosa e secreta, feita de um a outro coração, que só ao céu cabia ouvir, porque não eram vozes da terra, nem para a terra as diziam eles. As mãos, de impulso próprio, uniram-se como os olhares; nenhuma vergonha, nenhum receio, nenhuma consideração deteve essa fusão de duas criaturas nascidas para formar uma existência única.
Trecho do livro  Helena, de Machado de Assis.

domingo, 6 de junho de 2010

O toque das Ave-Marias

O sino da igreja ressoa distante. O toque das Ave-Marias. Na parede, o ponteiro do relógio marca o silêncio. Marca em mim  o entardecer do dia; o frio do inverno; a cama vazia; o vazio num quarto de hotel.
Francesca de L. Martins.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Charlatanismo

Amanheci em cólera. Não, não, o mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão mortas e não sabem, ou estão vivas com charlatanismo. E o amor, em vez de dar, exige. E quem gosta de nós quer que sejamos alguma coisa de que eles precisam. Mentir dá remorso. E não mentir é um dom que o mundo não merece.
Clarice Lispector.