sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Madalena

As janelas estão fechadas. Meia-noite. Nenhum rumor na casa deserta. Levanto-me, procuro uma vela, que a luz vão apagar-se. Não tenho sono. Deitar-me, rolar no colchão até a madrugada, é uma tortura. Prefiro ficar sentado, concluindo isto. Amanhã não terei com que me entreter.
Ponho a vela no castiçal, risco um fósforo e acendo-a, sinto um arrepio. A lembrança de Madalena persegue-me. Diligencio afastá-la e caminho em redor da mesa. Aperto as mãos de tal forma que me firo com as unhas, e quando caio em mim estou mordendo os beiços a ponto de tirar sangue. De longe em longe sento-me, fatigado e escrevo uma linha. Digo em voz baixa:
– Estraguei a minha vida, estraguei-a estupidamente.
A agitação diminui.
–Estraguei a minha vida estupidamente.
Trecho do livro São Bernardo, de Graciliano Ramos.

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